Atiraram-me ao ar, cai no chão, passei de mão em mão. Houve quem me desse beijos e quem me pisasse com os pés. Estou aqui dentro desta caixa há tanto tempo, já nem sei o que me espera... Haverá outros iguais a mim, por aí. Somos muitos.
E se nos reuníssemos para voltar à rua? Seríamos mil, duzentos mil? Seríamos muitos!
Faríamos uma festa, uma nova Revolução!
- Para quê? - Pergunta a menina a remexer nas coisas do sótão lá de casa.
- Para quê? Para haver liberdade.
- Liberdade?
– Sim, para podermos dizer tudo o que pensamos.
- Mas isso tu podes… Até podes pôr na Net, no YouTube… Não precisas de sair de casa.
- Fazer uma revolução sem sair de casa? Não me parece…
- Eu posso levar-te para a rua, se é o que queres.
- Mas não posso sair assim seco e amarfanhado, bem sei que tenho muitos anos mas…
A menina pegou em cola, arames e tintas e num instante ficou como novo. Parecia verdadeiro, lá por dentro era verdadeiro. As coisas de verdade são-no por dentro, mesmo com cola e tinta e verniz por fora.
- Então que tal te sentes?
- Magnífico! Vamos?
- Vamos!
Na rua, todos sorriam ao ver o cravo vermelho no chapéu da menina."
Sílvia Alves
Obrigado, Sílvia.
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